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Significado de Atos 12:18-23

No dia seguinte, Herodes e seus homens não conseguem encontrar ao fugitivo Pedro. O rei ordena que os guardas de Pedro sejam executados. Herodes parte de Jerusalém para a Cesaréia. Mais tarde, diante de uma multidão, trajando suas roupas reais, o povo grita que ele era um deus. Herodes recebe seu louvor. Deus envia um anjo para matar Herodes.

Lucas descreve as consequências da fuga de Pedro da prisão:

Logo que amanheceu, houve grande alvoroço entre os soldados sobre o que teria acontecido a Pedro (v. 18).

Pela manhã, o alarme foi acionado. Houve grande alvoroço entre os soldados, ou seja, houve uma grande perturbação. Quando foram dormir naquela noite, o prisioneiro estava em uma cela acorrentada a dois guardas e era guardado por homens do lado de fora. Porém, ao acordarem, o prisioneiro não estava lá. As correntes que prendiam seus pulsos estavam soltas. Os soldados não sabiam o que havia acontecido com Pedro.

O rei Herodes é informado sobre o desaparecimento de Pedro. Começa uma busca pelo prisioneiro foragido. O texto não diz a extensão dessa busca, apenas que ela falhou. Pedro provavelmente estava fora do seu radar em algum lugar, embora não tenha se escondido em situações passadas quando era procurado (Atos 4:31; 5:41-42; 8:1). Talvez Deus tenha frustrado os esforços de Herodes e seus soldados por encontrar o fugitivo. Assim, o paradeiro de Pedro não é descoberto e Herodes direciona sua decepção a seus próprios homens:

Herodes, tendo-o procurado e não o achando, inquiriu as sentinelas e mandou que fossem justiçadas (v. 19).

Ele inquiriu as sentinelas designadas para a detenção de Pedro, dezesseis ao todo, o que significa que ele os questionou sobre o que havia acontecido. Com dois guardas fisicamente acorrentados a Pedro e os quatorze restantes do lado de fora da cela ou trocando turnos, era difícil entender como Pedro havia escapado. Os próprios guardas nada sabiam. Eles não haviam visto o anjo.

Eles estavam adormecidos durante todo o processo. Herodes pode ter concluído que os guardas o haviam libertado. A explicação verdadeira seria terrível demais até mesmo para se ponderar. Herodes faz como qualquer tirano perverso faria em tal situação: ele ordena que os guardas de Pedro fossem executados. Como o seguidor de  Cristo não estava mais lá para ser executado, os guardas que o deixaram escapar tomariam seu lugar.

A perseguição após a fuga de Pedro diminui. Antes, Herodes estava ansioso para prender e matar aos membros da fé; agora que um dos principais cristãos havia escorregado por entre seus dedos, ele parece desistir de sua campanha contra a igreja. O moral entre seus próprios homens possivelmente estava muito baixo após a humilhação de perderem o prisioneiro e pela execução de seus companheiros. Jerusalém tornou-se um lugar decepcionante para o rei. Assim, Herodes "pega a bola e vai para casa", por assim dizer:

...e descendo da Judéia a Cesaréia, ali se demorou (v. 19).

Herodes Agripa I deixa Jerusalém, assim como a região da Judéia, onde Jerusalém estava localizada. Ele, então, passa um tempo na cidade portuária de Cesaréia. Cesaréia ficava a cerca de 120 quilômetros ao norte de Jerusalém.

O Herodes de Atos 12 foi o neto de Herodes, o Grande, que construiu a cidade de Cesaréia no importante porto daqueles dias, dando à cidade o nome de César Augusto, com o objetivo de obter favores diante do imperador.  Cesaréia logo se tornou a capital de Roma na região, abrigando a sede do governador romano.

Cesaréia, portnato, suplanta Jerusalém como a principal sede do poder romano; Jerusalém estava mais para o interior, localizada numa subida íngreme nas colinas. Cesaréia era mais conveniente para Roma, já que estava localizada na costa. Herodes Agripa I tinha uma casa lá, para onde talvez tenha ido após o constrangimento no caso de Pedro. Ele provavelmente tenha experimentado uma queda brusca de popularidade entre as elites religiosas judaicas.

Lucas nos informa sobre outro problema que Herodes enfrentou durante seu reinado relacionado à sua queda:

Herodes estava irritado contra os de Tiro e de Sidom; porém eles, de comum acordo, se apresentaram a ele e, depois de alcançar o favor de Blasto, camarista do rei, pediam paz, porque era do país do rei que se abastecia o país deles (v. 20).

O povo de Tiro e Sidom eram fenícios, um antigo grupo de povos cananeus (Gênesis 10:15, 19). Tiro e Sidom eram cidades antigas na costa da Fenícia, no Mediterrâneo, ao norte da Galiléia, atual Líbano. Ambas as cidades existem até hoje. Jesus passou um breve período de tempo na Fenícia durante Seu ministério. Foi lá que Ele admirou a fé da mulher cananéia e libertou sua filha de um demônio (Mateus 15:21-28).

Lucas relata que a Fenícia era abastecida pelo país do rei. Havia uma cadeia de distribuição de produtos entre as regiões da Judéia (sul de Israel), bem como Samaria e Galiléia (norte de Israel), levando alimentos para a Fenícia. Tiro e Sidom eram ricos portos marítimos, mas aparentemente trocavam seus alimentos com os povos agrícolas no território de Israel.

Como Herodes estava muito zangado com os moradores de Tiro e Sidom (não sabemos o motivo), ele aparentemente havia interrompido a exportação de alimentos a eles.

O povo de Tiro e Sidom busca agradar ao rei Herodes. Famintos e provavelmente temendo a reputação do rei de matar pessoas, eles buscavam ter paz com ele. Lucas descreve que os líderes de Tiro e Sidom eram amigos do camareiro de Herodes, Blasto. Os fenícios aparentemente haviam arquitetado uma estratégia diplomática bem-sucedida com Blasto.

Não sabemos nada sobre Blasto fora deste capítulo. Ele era o camareiro de Herodes, o principal servo que administrava sua casa, dinheiro e relacionamento com o público. Ele tinha muita influência sobre o rei.

O povo de Tiro e Sidom fizeram uma campanha bem-sucedida na busca por tornar Blasto simpático ao seu sofrimento. De acordo com o historiador judeu Josefo, uma "certa festa [era] celebrada para pedir segurança do rei" (Antiguidades dos Judeus, Livro 19, Capítulo 8). Podemos especular que o festival tenha sido organizado por Blasto, uma vez que ele havia sido conquistado pelo povo de Tiro e Sidom. O fato de ser identificado neste capítulo parece indicar que Blasto era o mediador entre os fenícios e Herodes. Ele parece ter organizado uma celebração para agradar ao rei, quando os fenícios prometem lealdade através de lisonjas para conquistar sua atenção. Neste evento, os moradores de Tiro e Sidom fizeram votos que garantiriam a paz e a segurança de Herodes.

Lucas registra que Herodes mostrou toda sua empáfia no festival:

Num dia designado, Herodes, vestido de traje real, sentado no trono, dirigia-lhes uma fala (v. 21).

Josefo descreve seu vestuário real em detalhes:

"Ele trajou uma veste feita inteiramente de prata, algo verdadeiramente maravilhoso. Ele entrou no anfiteatro ao amanhecer, momento em que a prata de suas vestes, iluminadas pelo raios do sol, brilharam de maneira surpreendente: tão resplandecente que espantou a todos os que o observavam atentamente" (Antiguidades 19.8).

Enquanto Herodes fazia seu discurso, o povo de Tiro e Sidom clamava: "É voz de um deus e não de um homem" (v. 22). Eles provavelmente o elogiavam e elevavam seu ego visando garantir seu favor e retomar a exportação de alimentos de seus reinos para suas cidades.

Mais uma vez, Josefo nos fornece mais alguns detalhes:

"Agora, seus bajuladores clamavam, um de um lugar e outro de outro (embora falsamente) que ele era um deus" (Antiguidades 19.8).

Na crônica de Josefo, os moradores de Tiro e Sidom pedem misericórdia a Herodes, dizendo que se antes o reverenciavam como homem, daquele dia em diante o louvariam como superior aos seres humanos. Josefo descreve a reação de Herodes: "O rei não os repreendeu quanto a isso, nem rejeitou sua ímpia bajulação" (Antiguidades 19.8).

A população de Tiro e Sidom o compararam a uma divindade, dizendo que ele falava com a voz de um deus. Ao longo da história, este parece ser o último elogio dado aos reis. Eles desejam ser deuses e certamente desejam ser adorados como deus (Daniel 3:1, 5). Esta foi exatamente a primeira tentação e o ponto central de todo o pecado, o engano sussurrado por Satanás a Eva no Jardim: "...sereis como Deus..." (Gênesis 3:4).

Deus aproveitou a oportunidade para lidar com Herodes de uma vez por todas: “No mesmo instante, um anjo do Senhor o feriu, por ele não haver dado glória a Deus; e, comido de vermes, expirou(v. 23). Herodes tomou para si a glória. Ele foi chamado de deus e não corrigiu os que o adoravam. Paulo e Barnabé teriam uma experiência semelhante nos próximos capítulos, porém rejeitariam tal adoração e redirecionariam seu público ao único Deus verdadeiro (Atos 14:11-15).

Herodes caiu subitamente atingido por um anjo do Senhor,  um dos mensageiros e servos de Deus que obedecem perfeitamente à vontade do Senhor. A morte de Herodes é assim descrita: “...e, comido de vermes, expirou” (v. 23).

Josefo descreve a morte de Herodes de maneira semelhante, relacionando-a com um problema estomacal que começou imediatamente apos ele aceitar a declaração de que ele era um deus:

"Uma dor forte surgiu em seu estômago; e ela começou da maneira mais violenta... Assim, ele foi levado para o palácio e logo o boato se espalhou de que ele certamente morreria em pouco tempo... Após passar cinco dias em constantes dores no estômago, ele partiu desta vida" (Antiguidades 19.8).

Este capítulo mostra dois exemplos de anjos do Senhor agindo nos assuntos humanos. Há sempre uma guerra espiritual acontecendo ao nosso redor (Efésios 6:12). Em Atos 12, um anjo resgata um homem inocente da prisão, Pedro, que dá a Deus a glória (v. 11); outro anjo derruba o homem que perseguiu a Pedro, porque ele não deu a Deus a glória.

É claro que não foi apenas este caso que decidiu o destino de Herodes. Este foi um momento icônico em sua vida, o ápice da constante desobediência de Herodes diante de com Deus, uma vida vivida para sua própria glória, ao invés de dar a Deus a glória.

Deus merece a glória porque Ele é a fonte de tudo o que é bom. Ele é a verdadeira bondade. Ele projetou a realidade e quando andamos em humilde obediência diante Dele, andamos corretamente (justamente). Caminhamos na realidade sempre que andamos nos desígnios de Deus.

Se andarmos desafiando aos desígnios de Deus, viveremos em desafio ao verdadeiro bem, à verdadeira realidade. Se desafiarmos a Deus, estaremos pecando (o que significa que estaremos errando o alvo). Herodes estava constantemente errando o alvo. Em vez de criar harmonia e florescimento humano, ele trazia divisão e violência. Ele explorava aos outros para proveito próprio. Seu fim é uma advertência a todos nós.

Herodes não deu a Deus a glória, porém atribuiu glória a si mesmo. O termo “glória” significa a demonstração visível da essência de alguém ou algo (1 Coríntios 15:40-41). Herodes aceitou a falsa glória proferida pelo povo de Tiro e Sidom como se fosse verdade.

A glória da qual eles falavam era em louvor a um deus e Herodes aceitou essa avaliação de si mesmo. Porém, somente Deus é Deus (Deuteronômio 4:35,; 396:4). Herodes não apenas agiu com orgulho, mas voluntariamente perpetuou uma mentira que desafia a verdade e a realidade. A mentira fundacional da queda do homem foi a de que ele poderia criar o seu próprio padrão de bondade separada de Deus (Gênesis 3:4).

Um versículo do Antigo Testamento citado três vezes no Novo Testamento mostra que o oposto bíblico do orgulho é a fé:

"Eis que a sua alma está orgulhosa, não é reta nele; mas o justo viverá pela sua fé" (Habacuque 2:4).

O oposto da fé em Deus é a fé em si mesmo, ou seja, o orgulho. Porém, a fé em si mesmo é uma ilusão, como ilustra a história de Herodes Agripa I. É razoável dizer que a humildade é o antídoto para o orgulho, assim como a humildade é o desejo de lidar com a realidade como ela é. Se nos envolvermos com a realidade como ela é, veremos que Deus é a fonte de toda a bondade e buscaremos seguir aos Seus caminhos, que sempre nos levarão a seguir a Seus desígnios para nós (portanto, para o nosso bem).

Deus é a essência da existência. Assim, humildade é procurar ver as coisas na perspectiva de Deus, porque a perspectiva Dele é sempre verdadeira e correta. Herodes não reconhecia essa perspectiva. Ele estava focado apenas no que queria em cada momento. Num dado momento ele persegue aos crentes e os executa para ganhar pontos políticos e louvores dos homens. Em outro momento ele estabelece um acordo comercial para alcançar o elogio dos homens.

Herodes confiava em si mesmo. Porém, o Senhor o derrubou, ilustrando que, no final, o orgulho humano não nos leva a nada.

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