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Significado de Mateus 12:1-8
O relato do paralelo deste evento do Evangelho é encontrado em Marcos 2:23-28 e em Lucas 6:1-5.
Após a confirmação codificada de que Jesus Ele era o Cristo no capítulo anterior, Mateus retoma sua narrativa sobre o Messias.
Ele inicia com a frase Naquele tempo para mostrar que o que vem a seguir se passou mais ou menos no mesmo momento que os eventos anteriores (Mateus 11). Mateus usa a palavra “kairos” para descrever esse momento. “Kairos” significa estação. Nesse contexto, “kairos” descreve um momento generalizado de tempo, não um momento específico.
Porém, Mateus faz questão de deixar evidente que esta interação acontecera no dia específico da semana que era o Shabat. Isso é muito importante porque o Shabat era o dia santo para os judeus, um dia separado para Deus. O Shabat ocorria nos finais da semana. Começava no pôr do sol do sexto dia e durava até o pôr do sol do dia seguinte, 24 horas depois. O Shabat era um dia de descanso. Sua obrigatoriedade era uma ordem dada por Deus, passada a Moisés através dos Dez Mandamentos. O Shabat é mencionado muitas vezes no Antigo Testamento e é o quarto dos Dez Mandamentos. A ordem original para honrar o Shabat é encontrada em Êxodo 20:8-11:
“Lembra-te do dia de sábado, para o santificar. Seis dias trabalharás e farás toda a tua obra; mas o sétimo dia é o sábado de Jeová, teu Deus. Nesse dia, não farás obra alguma, nem tu, nem teu filho, nem tua filha, nem teu servo, nem tua serva, nem teu animal, nem o teu estrangeiro que está das tuas portas para dentro; porque em seis dias fez Jeová o céu e a terra, o mar e tudo o que neles há; por isso, Jeová abençoou o dia sétimo e o santificou.”
De todas as práticas judaicas, o cumprimento semanal do Shabat era, talvez, a característica mais familiar, já que ocorria todas as semanas e incluía todas as classes de judeus. Eles deveriam fazer todos os seus trabalhos nos primeiros seis dias da semana, mas no Shabat toda forma de trabalho e atividades eram interrompidas para que tivessem um momento de descanso, considerado uma parte integral do louvor a Deus. Este dia servia como um lembrete constante a todos os Judeus de que Deus era o Criador e eles eram o povo de Deus.
Certo dia, Jesus foi até os campos de grãos com Seus discípulos no Shabat. O fato de Seus discípulos estarem com Ele indica que os doze discípulos haviam regressado da missão à qual haviam sido enviados (Mateus 10:5-15), ou que este era um outro grupo de discípulos. Enquanto caminhavam, Seus discípulos ficaram com fome. E naturalmente, começaram a colher trigo para comer.
Mas, quando os fariseus viram que Seus discípulos estavam fazendo isso, eles acusaram Jesus. Isso indica que os fariseus estavam seguindo a Jesus, assim como os outros discípulos O seguiam. Eles disseram: “Olhe, Seus discípulos estão fazendo algo fora da lei no Shabat”. Levando em consideração o tom da conversa dos fariseus, é de se imaginar que seu propósito em seguir a Jesus não era para aprender com Ele e andar em Seus ensinamentos. Ao invés disso, fica claro que os fariseus tinham o objetivo de questionar Jesus e Seus ensinamentos.
A principal tática de acusação dos fariseus contra Jesus neste momento foi a de atacar Sua credibilidade. Seu argumento era de que o fato de Seus discípulos terem violado o costume do Shabat (com a aprovação de Jesus), isso O expunha como uma fraude ou, para se dizer o mínimo, um péssimo mestre. A acusação era séria. Guardar o Shabat era uma questão vital, tratada de forma inegociável no Antigo Testamento. Uma das ofensas que Deus tinha contra Judá, e que acabou por levar a tribo ao exílio na Babilônia, havia sido sua negligência para com o Shabat (Jeremias 17:19-27).
Os fariseus não apenas acusaram a Jesus de quebrar a Lei. Eles também ficaram imensamente ofendidos. Não porque os discípulos de Jesus haviam violado a Lei de Deus no dia do Shabat (eles não haviam). Os fariseus estavam ofendidos porque os discípulos de Jesus haviam violado suas próprias leis relacionadas ao Shabat. No fundo, a ofensa dos fariseus tinha a ver com a suposição perigosa de que suas próprias regras eram as leis de Deus. Os fariseus tinham perigosamente se colocado no lugar de Deus.
Como isso aconteceu?
Para resumir em uma palavra: gradualmente. Depois que os judeus voltaram do exílio na Babilônia, sua reverência pela Lei de Deus havia sido renovada (Neemias 8:8). Entre todos os mandamentos e costumes antigos, o Shabat era a lei que os judeus mais levavam a sério. Neemias teve um papel importante em restaurar essa prática (Neemias 12:15-22). Porém, embora Neemias tenha restaurado a prática da Lei de Deus, outros líderes haviam começado a adicionar tradições criadas por homens. Nos séculos seguintes, muitas dessas normas religiosas se multiplicaram. Os fariseus lideravam o avanço disso. Suas justificativas para as novas observações se baseavam na tentativa de assegurar a proteção dos judeus, a fim de nem sequer chegassem perto de uma transgressão. Isso era compreensível, considerando o alto preço que os judeus haviam pago pela quebra da lei do Shabat, entre outras ofensas (1 Crônicas 9:1). Assim como normalmente acontece, com o tempo, essas regras se transformaram em uma fonte de poder para os líderes. Sua intenção original ficou em segundo plano. Seguir as regras passou a ser mais importante que os motivos pelos quais as Leis haviam sido criadas. E isso acabou se transformando em um tipo de regulação humana que ultrapassava as leis de Moisés. Assim, de forma muito irônica, tal prática levou os judeus para um outro tipo de quebra da lei do Shabat, algo ao qual Jesus chamará sua atenção. É normal uma instituição buscar proteger uma tradição, mas elas acabam se preocupando mais com a perpetuação do poder e influência de seus líderes. Este era certamente o caso dos fariseus.
No século 3 a.C., muitas mudanças haviam se desenvolvido depois do exílio babilônico e codificadas no Mishnah judaico, que reduziu a tradição oral para a escrita. No entanto, a tradição oral ainda tinha uma influência poderosa durante a época de Jesus e era comum ser conhecida como “a tradição dos anciãos” (Mateus 15:2). Porém, ainda que tais tradições começaram com a boa intenção de honrar a Deus, na prática tais regras haviam substituído e efetivamente anulado o coração dos mandamentos originais de Deus (Mateus 15:6). Seu foco havia mudado de seguir a Deus para manter e aumentar sua própria importância, prestígio e poder.
Percebendo a acusação dos fariseus e sua ofensa, Jesus reformula a pergunta.
Os fariseus se ofendem novamente e acusam os discípulos de não fazerem o que estava na lei em relação ao Shabat. Jesus responde como uma história e uma declaração. Ele faz a eles uma pergunta retórica que começa de forma interessante: Vocês não leram o que Davi fez? Claro que, os fariseus, especialistas nas Escrituras, haviam lido o que Davi fez quando ficou com fome ao fugir de Saul com seus companheiros leais. Eles foram até Aimeleque, o sacerdote, para pedir ajuda. Eles estavam famintos. Aimeleque não tinha nenhum tipo de pão comum para dar a eles, apenas o pão sagrado. Davi e seus companheiros não poderiam comer daquele pão, apenas os sacerdotes. Contudo, Aimeleque ofereceu a Davi e seus companheiros o pão consagrado, depois de se certificar de que eles tivessem se abstido de relações sexuais. Davi e seus companheiros não tinham tido relações sexuais e, então, o sacerdote deu a eles o pão sagrado para comer. Essa história pode ser encontrada em 1 Samuel 21:1-6.
A Escritura não condena nem a Davi, nem a Aimeleque por tal atitude. Normalmente, isso jamais deveria ser permitido, mas a exeção foi feita porque Davi era o Rei ungido de Israel. A situação desesperada na qual ele estava, sendo perseguido, deu a ele aquele direito. Ao citar esse exemplo, Jesus mostra aos fariseus como a Escritura deixa espaço para a graça. A Lei de Deus deve ser um benefício, não um peso. Mesmo que seja absoluta, existe uma hierarquia e o amor e cuidado para com as pessoas sempre devem vir acima da mera conformidade com a lei. Como Messias, Jesus também era o Rei ungido. Ele também estava seguindo Seu chamado na justiça. A Ele também deveria ser permitida a exceção para o costume do Shabat dos fariseus. É importante notar que os discípulos estão apenas pegando e comendo os grãos, não colhendo para comercializá-los. Isso está correlacionado com a história de Davi: seres humanos necessitam de comida.
Jesus faz outra pergunta retórica: Ou vocês não leram a Lei, que no Shabat os sacerdotes no templo violam o Shabat e ficam sem culpa? Esta declaração vem de Levítico 2:1-3 e Levítico 6:14-18. Essas duas passagens descrevem as ofertas de grãos apresentadas ao Senhor. Quando elas eram oferecidas no Shabat, o sacerdote, que estava no processo de ministrar tais ofertas, precisava cozinhar o grão, que tecnicamente era um tipo de trabalho e, portanto, uma “violação” do Shabat. Mas, obviamente, Deus não considera esse tipo de trabalho sacerdotal como uma violação do Shabat. E nem os fariseus. Este é o ponto de Jesus. Os sacerdotes se mantinham inocentes mesmo trabalhando e cumprindo seus deveres no Shabat. A natureza sagrada e seu papel como sacerdotes no templo os absolvia.
Depois de estabelecer os fundamentos para Seus argumentos com a história do rei Davi e a referência relacionada aos sacerdotes do templo, Jesus faz uma declaração surpreendente:
Mas eu digo a vocês, aqui está algo mais importante que o templo.
Jesus faz essa declaração corajosa balizado em Sua própria autoridade como Deus: Mas Eu vos digo. Sua declaração é a de que Ele é Deus. Aos olhos dos judeus, a única coisa mais importante que o templo de Deus era o próprio Deus. Assim, quando Jesus diz a esses líderes judeus Aqui está algo mais importante que o templo, Ele diz claramente que Deus estava entre eles. E que todas as indicações apontavam para Jesus como sendo Deus.
Esta era uma questão muito maior do que a questão sobre quem poderia pegar e comer grãos no Shabat. Se Jesus realmente era Deus, então Ele poderia fazer o que bem quisesse. Se Deus permitiu que os sacerdotes do templo “violassem” o Shabat enquanto serviam em seu posto como sacerdotes, Ele certamente Se permitiria “violar” as tradições dos fariseus relacionadas ao Shabat.
Jesus, então, critica os fariseus por não enxergarem a perspectiva completa na Lei de Moisés: Mas, se vós tivésseis conhecido o que significa: Misericórdia quero e não holocaustos, não teríeis condenado os inocentes. A lei de Deus foi feita para abençoar as pessoas. Qualquer organização humana que opere de acordo com os princípios dos Dez Mandamentos será um lugar de efetivo apoio à prosperidade das pessoas. Quem não quer ser parte de um grupo que honra o próximo, diz a verdade, celebra e trabalha para ver o sucesso dos outros? Portanto, quando a aplicação de uma lei é feita sem compaixão para com o bem-estar e crescimento das pessoas, esta lei é ruim.
Os fariseus conheciam esses textos, mas não os viviam. Assim, no caso do Shabat, eles não sabiam o que aquelas palavras realmente significavam. Misericórdia quero, e não sacrifícios. Este texto vem de duas fontes no Antigo Testamento: o rei Davi e o profeta Oséias.
O Salmo 51 fala do arrependimento e esforço de Davi de realinhar seu coração com o coração de Deus:
“Pois tu não te comprazes em sacrifícios; do contrário, eu to ofereceria; não te deleitas em holocaustos. Os sacrifícios a Deus são o espírito quebrantado; ao coração quebrantado e contrito, ó Deus, tu não o desprezarás.” (Salmo 51:16-17)
“Pois misericórdia quero e não sacrifício; e o conhecimento de Deus, mais do que holocaustos.” (Oseias 6:6)
O que Jesus quer dizer é que Deus se importa muito mais quando as pessoas O amam e O obedecem em seu coração do que com a obsessiva obediência a regras religiosas (representadas na referência bíblica como “sacrifícios”). Se os fariseus soubessem disso, eles não teriam condenado os inocentes. Os inocentes condenados pelos fariseus, com certeza, incluíam Jesus e Seus discípulos no incidente da colheita dos grãos no Shabat. Mas os inocentes também incluem a todos os que estão cansados e sobrecarregados (Mateus 11:28) pelos pesos opressivos e pelas ameaças sociais que os fariseus usavam para manipular o povo e se manter no poder. Os fariseus eram espiritualmente abusivos com as pessoas a quem eles deveriam guiar.
Jesus termina Sua refutação com outra reivindicação divina: Pois o Filho do Homem é o Senhor do Shabat. Deus havia estabelecido o Shabat e Ele é Seu único Senhor Legítimo. O Filho do Homem era um termo messiânico velado, porém definitivo (veja o comentário de Mateus 9:6). Este foi o termo mais usado por Jesus para descrever a Si mesmo. Quando Jesus diz que O Filho do Homem é o Senhor do Shabat, Ele estava declarando: “Eu sou Deus e eu decido o que é permitido fazer no Shabat - não vocês!”