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Significado de Mateus 6:9-15
Jesus ensinou a Seus discípulos dois tipos de oração a serem evitados. Ele os admoestou a não orar de forma tola, como faziam os hipócritas egoístas em lugares públicos, apenas buscando ser honrados pelos homens. Ele também alertou que não fizessem orações sem sentido, como faziam os gentios que não tinham relacionamento com seus deuses e repetiam palavras vazias e não sabiam se seriam ou não ouvidos. Agora, Jesus mostra a Seus discípulos como deveriam orar: sua oração devia seguir o Seu padrão.
A oração que Jesus ensina não são palavras a serem repetidas. É apenas um modelo, uma maneira, um padrão sobre como orar. É uma perspectiva e uma postura que os discípulos deveriam ter enquanto falavam com seu Pai com seu coração. Para isso, Jesus apresenta um novo quiasmo.
Os quiasmos eram um formato comum que os judeus empregavam para expressar seus pensamentos. Os quiasmos são declarações que espelham outras declarações, de fora para dentro. Eles seguem o padrão A-B-C...C’-B’-A’. A ideia central do quiasmo está localizada no centro.
A estrutura do quiasmo do que é conhecida como “A Oração do Pai Nosso” ou “O Modelo de Oração” é a seguinte:
A. Pai nosso, que estás nos céus; santificado seja o teu nome.
B. Venha o teu reino; seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu.
C. O pão nosso de cada dia nos dá hoje.
D. E perdoa-nos as nossas dívidas,
D’. Assim como nós também temos perdoado aos nossos devedores.
C’. E não nos deixes cair em tentação, mas livra-nos do mal.
B’. Pois teu é o reino,
A’. O poder e a glória para sempre. Amém.
As frases A e A’ espelham uma à outra, da mesma forma que B e B', C e C’, D e D’. O conceito central está em D e D’, referindo-se à misericórdia e à confissão. É um pedido a Deus para nos tratar da mesma forma que tratamos a outros. Quando oramos neste modelo, confessamos o segundo grande mandamento, que é tratar as pessoas como desejamos ser tratados, mostrando misericórdia e perdão a outros porque também queremos ser perdoados. Após terminar com um “Amém”, Jesus explica o princípio central da oração nos versículos 14 e 15. O fato de Ele explicar a oração pode indicar que Ele observou algum nível de confusão em relação à parte principal da oração, ou seja, a confissão e o pedido por misericórdia: “E perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós também temos perdoado aos nossos devedores.” Jesus explica o ponto mais relevante nos versos 14 e 15:
“Pois, se perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celestial vos perdoará; mas, se não perdoardes aos homens, tão pouco vosso Pai perdoará as vossas ofensas.”
Faz sentido a explicação de Jesus sobre esta declaração, porque não é algo natural para nós pedir a Deus que nos “trate como tratamos ao nosso próximo”. Nossa natureza humana tipicamente nos conduz a buscar um tratamento especial. Podemos facilmente racionalizar nossos comportamentos (“Ah, tal pessoa teve o que mereceu”), enquanto, ao mesmo tempo, pedimos por misericórdia (“Eu mereço”). Porém, Deus deixa claro que este não é o caminho que devemos trilhar. Ele nos dá a mesma medida de misericórdia que demonstramos a outros. Assim sendo, a Oração do Pai Nosso contém um ajuste de atitude. Não podemos orar de verdade sem primeiro lidar com nossa amargura ou ira em relação a outras pessoas. Ou estaremos fazendo falsas confissões.
A provisão mais importante deste tipo de oração reflete os dois grandes mandamentos (Mateus 22:37-40). Ela reflete o segundo mandamento, ou seja, tratar aos outros como desejamos ser tratados e remover todas as barreiras para ter um bom relacionamento com eles. Ela também reflete o primeiro mandamento, que é “amar a Deus de todo nosso coração”, pedindo a Ele que tenha misericórdia e perdoe nossos pecados, para que possamos ter comunhão diária com Ele.
A oração de Jesus começa assim: “Pai nosso, que estás no céu”. Em cada linha da plataforma apresentada aos discípulos por Cristo no Sermão da Montanha observamos a descrição de Deus como Pai. Esta frase apresenta Deus como uma figura de autoridade cheia de amor por aqueles com quem Ele tem uma relação pessoal e familiar. A parceria e intimidade entre os discípulos de Jesus e Deus Pai é muito forte, mesmo que a aparente distância entre o Seu trono no céu e a condição humana na terra pareça ser um abismo metafísico.
Falando sobre Seu Pai Celestial e dirigindo-se a Ele, Jesus acrescenta: “Santificado seja o teu nome”. Esta declaração completa o pensamento A do quiasmo e corresponde à frase A’ de que o poder e a glória pertecem a Deus para sempre. Mateus usa a forma passiva do verbo grego “Hagiazo” (G37), traduzido como “santificado”. Esta palavra é frequentemente apresentada como verbo (santificar) ou substantivo (santo). Aqui, Jesus quer dizer que o nome e a reputação de Deus devem ser “separados”, “distintos”, “altamente honrados e respeitados”. Quando pensamos em nosso Pai Celestial, não devemos pensar Nele como uma “pessoa qualquer” ou como uma máquina cósmica de venda de produtos, ou ainda como um tirano que precisa ser apaziguado. Devemos santificar Seu nome e reconhecê-lo pelo que Ele é: o Criador e o Rei Todo-Poderoso do universo. Todo poder e glória pertencem a Ele para sempre. Esta atitude reflete o primeiro e grande mandamento: amar a Deus de todo o nosso ser.
Jesus, então, ora: “Venha o teu reino”. “Teu” aqui se refere ao nosso Pai Celestial. O reino é o reino sobre o qual João Batista e Cristo pregavam. Este reino estava às portas (Mateus 3:2; 4:17). É o reino que Jesus veio proclamar durante Seu sermão (mateus 5:3; 5:10; 5:20; 5:34; 6:10; 6:13; 7:21). É o reino que não é deste mundo (João 18:36).
O público de Jesus, Seus discípulos, provavelmente entenderam que a oração incluía uma petição pelo Reino Messiânico em Israel. O Antigo Testamento havia profetizado que o Messias reinaria no trono de Davi para sempre (2 Samuel 7:7-18). Esta profecia é confirmada no Novo Testamento (Atos 13:22-39). Os livros do Novo Testamento foram escritos após a morte, ressurreição e ascenção de Jesus ao céu. Eles contêm uma revelação expandida sobre este assunto. Não apenas Jesus reinará sobre Israel no trono de Davi (2 Samuel 7:13), mas haverá um novo céu e uma nova terra (Apocalipse 21:1-4). Quando o céu descer à terra, a vontade de Deus será feita na terra, já que o céu terá descido para cá.
Após Jesus ter ressuscitado dos mortos, Seus discípulos perguntaram a Ele: “Senhor, é agora, porventura, que restabeleces o reino a Israel?” (Atos 1:6). Talvez eles estivessem orando como haviam sido ensinados e agora quisessem saber se Jesus estava pronto para trazer Seu Reino na forma física através da restauração de Israel. Jesus informou a Seus discípulos que havia um plano mais elevado que demandaria um poder espiritual. Mas Jesus não disse aos discípulos que não haveria reino algum. Ao invés disso, Ele respondeu, em Atos 1:7, que não cabia a eles saber quando o reino de Israel seria restaurado. Jesus claramente confirma que o reino seria fisicamente restaurado, porém em um tempo desconhecido.
A realidade do reino de Deus é absoluta e abrangente. Paradoxalmente, sua existência (tanto na oração de Jesus com os discípulos quanto agora) ainda não é completamente visível ou compreendida. Quando oramos conforme Jesus nos ensinou, Venha o teu reino, estamos pedindo que o reiino de Deus encha toda a terra com sua bondade e seja uma realidade nesta terra, tornando-se visível a todos. Este é nosso pedido: “Que vivamos na harmonia social que o Senhor planejou desde o início”. A instrução de Jesus é que peçamos não apenas para que Deus faça o Seu Reino conhecido, mas também que Seus discípulos entendam a realidade de que Deus está sempre sentado em Seu trono. Quando esta declaração é conectada com o ponto central da oração - uma vida de perdão e serviço ao próximo - ela pode ser vista como uma petição por graça, para que Seu reino espiritual flua através de nós para o mundo físico.
O reino de Deus prevalece para sempre. Os seguidores de Cristo precisam reconhecer esta verdade e agir de acordo com ela. O fato de a Judéia ser um estado-cliente de Roma é irrelevante. O fato de a injustiça, a opressão e a tirania serem a realidade social visível é irrelevante. A recompensa deles (ou a nossa) não vem dos reinos que hoje aparecem e amanhã se vão. Ela vem do nosso Pai, o Rei de tudo o que foi e de tudo o que ainda virá.
Jesus, então, declara: “Seja feita a tua (Pai) vontade, assim na terra como no céu. Esta é a frase B do quiasmo, que corresponde à declaração B’: “Pois teu é o reino”.
O Céu é o lugar onde a vontade de Deus é realizada. No Céu a vontade de Deus é feita de forma perfeita e sem exceção. A condição da terra é, obviamente, bastante diferente como resultado da queda do homem(Gênesis 3). Quando os seguidores de Jesus andam em obediência, eles trazem o céu para a terra, no sentido de que o céu é o lugar onde a vontade de Deus é feita.
Cristo veio à terra como homem para fazer o que Adão havia falhado em fazer, ou seja, vive em submissão a Deus como homem. Cristo veio à terra como Deus para restaurar a humanidade, para que os humanos reinassem sobre a terra em harmonia com Deus, com a natureza e uns com os outros, como haviam sido criados para ser (Salmo 8; Hebreus 2:5-12). Seu duplo propósito de submissão e restauração transformou a terra em Seu reino, não apenas como Deus, mas também como homem (Filipenses 2:5-11; Apocalipse 3:21). Quando o Messias veio, Ele proclamou a verdade e convidou as pessoas a se arrepender e abandonar seu orgulho e pecado, que sempre leva à morte, para que fossem conectados a Ele e restaurados para viver seu destino de reinar com Ele em Seu Reino eterno. Para aceitar plenamente a oferta de Cristo, precisamos crer que Jesus é Deus (João 20:31) e obedecer à Sua vontade na terra (2 Coríntios 5:9, 10). Esta é a Sua vontade: que amemos a Deus, em obediência a Cristo, seguindo Seu exemplo. Jesus derramou Sua vida para servir ao próximo (Marcos 8:34-38; Romanos 12:1, 2; Filipenses 2:5-8; Apocalipse 3:21).
Após orar pela vinda do reino de Deus e pela realização da Sua vontade na terra, da mesma forma que ela é feita no céu, Jesus aponta para a dependência física que o homem tem de Deus. Ele ora: “O pão nosso de cada dia nos dá hoje”. Como criaturas físicas, precisamos de alimento material para sustentar nossos corpos. Nosso corpo precisa de comida regularmente (diariamente) para que funcione bem. Qualquer pessoa que tente passar sem comida por um período longo de tempo é humilhada pela fome. Ainda que pensemos que nosso alimento foi produzido pelas nossas próprias mãos, no final das contas tudo vem de Deus. Deus, em Sua graça, criou o mundo com coisas boas para comermos e sermos satisfeitos em nossa necessidade física. Tiago escreve o seguinte: “Toda boa dádiva e todo dom perfeito vêm lá de cima, descendo do Pai das luzes” (Tiago 1:17).
Ao pedirmos que Deus nos dê o pão de cada dia, estamos confessando nossa dependência física do Pai. Após reconhecer que nosso Pai está no céu e ter santificado o Seu nome, Jesus instrui aos discípulos a pedir a Deus que satisfaça suas necessidades materiais. Isso não significa exigir nada de Deus. É um reconhecimento de dependência. Cristo nos ensina a expressar dependência e pedir para a satisfação das nossas necessidades básicas. A tendência humana é considerar tudo o que temos como algo normal, antes de pedir mais. Ao focarmos em nossas necessidades diárias, colocamos nossa mente numa posição de gratidão por termos o que comer diariamente.
O fato de Jesus incluir a frase de cada dia enfatiza que devemos vir a Deus com frequência. Podemos e devemos nos chegar a Ele sempre que tenhamos necessidades, que aparecem todos os dias. O foco no termo cada dia também estabelece uma perspectiva no tempo presente. Parte das limitações que Deus deixou no ser humano é a capacidade de aprender com o passado, mas não de alterá-lo. Não podemos saber o futuro. O impacto das nossas escolhas somente pode afetar o presente. Jesus vai apresentar esta aplicação prática no versículo 34, quando dirá a Seus discípulos: “Não andeis, pois, ansiosos pelo dia de amanhã, porque o dia de amanhã a si mesmo trará seu cuidado; ao dia bastam os seus próprios males.”
O pão era o alimento mais conhecido no mundo antigo, incluindo na Judéia. Vivendo em uma sociedade agrícola, a vida de Jesus girava em torno do processo de produção de pão. Muitas das parábolas de Jesus comunicam esta mensagem. Todos os judeus sabiam sobre o que Ele estava falando, pois estavam direta ou indiretamente envolvidos na produção agrícola - aragem do solo, plantio de semente, colheitas, moagem de grãos, produção de massas, uso de fermentos e, também, a produção de pães. O pão era consumido por todas as pessoas todos os dias de suas vidas. Então, com certeza servia como símbolo de sobreviência básica para todos.
Para os judeus, o pão também tinha significado cerimonial. A celebração da Páscoa consistia de pão sem fermento. A ausência do fermento significava a prontidão dos filhos de Israel na saída do Egito. Eles não esperaram o pão crescer. Da mesma forma, durante os quarenta anos no deserto, Deus proveu a eles o maná (uma substância parecida com o pão) diariamente, com vistas a sustentar a Seus filhos. Moisés disse ao povo de Israel que Deus havia permitido que eles tivessem fome para que aprendessem a depender Dele (Deuteronômio 8:3). Esta oração estava sendo ensinada por Jesus - o Pão da vida (João 6:35) -, que havia nascido em Belém (a “Casa de Pão”). Além de nos submetermos à realidade da nossa dependência do Pai Celestial pelo pão diário, Jesus também diz a Seus seguidores que reconhecessem sua dependência espiritual. Esta é a frase C do quiasmo, refletindo a declaração C’, que identifica nossa dependência espiritual: E não nos deixes cair em tentação, mas livraí-nos do mal.
Agora, Jesus chega ao coração da oração e do quiasmo. A primeira metade desta parte central é o perdão das nossas dívidas. Embora não tivesse pecado, Jesus ensina que Seus discípulos devem reconhecer e pedir a Deus por Seu perdão. É um pedido de misericórdia, com certeza, mas não conseguiremos absorver o significado completo disso até que correlacionemos esta declaração com a seguinte: “Assim como nós perdoamos aos nossos devedores”. Esta é a oração que pede a Deus para nos tratar da mesma forma que tratamos ao nosso próximo. Nós demonstramos misericórdia aos outros e os perdoamos porque também queremos ser perdoados.
Misericórdia para o misericordioso é um tema recorrente no Sermão da Montanha.
Este é o princípio central do quiasmo do Makarios (“Bem-Aventurados”): “Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia” (Mateus 5:7).
Ele reaparece quando Jesus está ensinando a respeito da trave no olho: “Porque, com o juízo com que julgais, sereis julgados” (Mateus 7:2).
E é cristalizado na Regra de Ouro: “Portanto, tudo o que quiserdes que os homens vos façam, fazei-o assim também vós a eles; porque esta é a lei e os profetas” (Mateus 7:2).
E, caso os discípulos não tivessem conseguido assimilar o ponto principal da oração, Jesus explicitamente reforça o princípio da misericórdia imediatamente após Sua oração: “Pois, se perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celestial vos perdoará; mas, se não perdoardes aos homens, tão pouco vosso Pai perdoará as vossas ofensas” (Mateus 6:14, 15). Note: Jesus faz uma declaração positiva: Se perdoardes aos homens, vosso Pai vos perdoará; e uma declaração negativa: Se não perdoardes aos homens, vosso Pai não vos perdoará.
O princípio da misericórdia é este: Não apenas perdoamos ao nosso próximo porque fomos perdoados. Nós perdoamos ao nosso próximo porque queremos ser perdoados. Esta declaração levanta uma pergunta. Jesus estava ensinando isso a Seus discípulos, pessoas que já criam Nele. Então, por que eles ainda precisariam ser perdoados? O Novo Testamento nos ensina que Jesus pagou por todos os nossos pecados (Romanos 6:5-11). Então, por que existe a necessidade de mais perdão? Jesus está falando aqui sobre o relacionamento entre as pessoas. O marido e a esposa devem se casar uma só vez. O comportamento futuro de um deles não deve alterar a realidade do casamento. No entanto, para que tenham harmonia, o marido e a esposa devem se perdoar mutuamente muitas vezes após seu casamento.
O coração da Oração do Pai Nosso nos ensina que a harmonia relacional com Deus é determinada pela forma como tratamos ao nosso próximo. É como um pai ou mãe que tira o chocolate do filho porque ele pegou o chocolate de um amiguinho, visando ensiná-lo uma valiosa lição (“Foi assim que seu amiguinho se sentiu”). Podemos também inferir que a nossa capacidade de nos relacionar com Deus é diretamente afetada pela forma como tratamos as pessoas à nossa volta. Por exemplo, se guardamos amargura contra alguém que nos feriu, tal atitude pode reduzir nossa capacidade de nos relacionar com Deus, talvez pelo fato de estarmos focados em como fomos tratados injustamente. Tal atitude nos remove da comunhão com Deus, já que Ele perdoou nossos pecados, sem merecermos. Assim, Jesus instrui Seus discípulos a escolher perdoar, ao invés de guardar a ofensa.
É válido refletir, mais uma vez, que o coração deste modelo de oração é pedir a Deus que nos trate como tratamos aos outros, particularmente que peçamos a Deus para nos perdoar da mesma forma que perdoamos ao nosso próximo. Parece claro que o perdão aos outros é o pré-requisito para entrarmos na presença de Deus em oração.
Uma outra questão aparece aqui: “O que Jesus quis dizer quando nos instruiu a perdoar os outros?” Será que isso significa que nunca devemos contradizer, confrontar ou nos opor a ninguém? Tal pensamento é uma impossibilidade, já que Jesus regularmente confrontou várias pessoas. Será que significa que não devemos brigar ou contender contra um princípio do mal? Novamente, Jesus e Seus discípulos fizeram isso. No entanto, embora Jesus tenha abertamente exposto as autoridades corruptas do Seu tempo, Ele não se opunha a eles no nível pessoal. Já pregado na cruz, Ele pediu a Deus por Seus assassinos: “Pai, perdoa-os” (Lucas 22:34). Isso indica que Jesus queria o melhor para eles. Veremos Jesus desnudar os fariseus em Mateus 23. As “chicotadas verbais” que Ele dá nos fariseus foram humilhantes. Contudo, Jesus sempre oferecia a eles a oportunidade de se arrepender.
Neste modelo de oração, Jesus usa a palavra dívida para descrever o que precisa ser perdoado. Fica claro que essas dívidas são sinônimas de transgressões, haja vista a explanação de Jesus a respeito do ponto principal da oração (Mateus 6:14, 15). A ênfase parece estar no entendimento de que essas transgressões haviam ocorrido no passado e continuavam existindo no presente.
Uma dívida ocorre numa transação entre pessoas, onde aquela que recebeu algo precisa devolver o que pegou. Neste caso, a pessoa que ora foi ofendida e a ofensa ainda é existente. Ela ainda não foi devolvida. Para poder dizer a Deus como nós perdoamos aos nossos devedores, a dívida precisa ter sido cancelada, já que a frase como nós perdoamos está no tempo passado. Perdoar dívidas que alguém nos deve significa, então, o cancelamento da obrigação de devolver o que a pessoa tomou. No caso de uma ofensa. A devolução pode ocorrer através de alguma forma de punição. O cancelamento desta dívida tem o efeito de aliviar a necessidade que temos de tomar os passos necessários para trazer justiça sobre o ofensor.
É importante destacar também que os termos dívidas e transgressões estão no plural. Parece que Jesus estava querendo dizer que cada pessoa que se chegasse a Deus em oração deveria estar ciente de que teria inúmeras dívidas pendentes que violaram os padrões de Deus. A palavra transgressões citada em Mateus 6:14, 15 é um termo grego traduzido por queda, pecado, ofensa e falta (“paraptoma”, G3900). Ela se refere á violação de um padrão ético. Neste contexto, ela se refere à ofensa de alguém contra os padrões que deveriam ser parte da vida de um discípulo de Cristo, uma violação de valores ou, talvez, uma ofensa a si próprio, por exemplo, o sentimento de auto-comiseração. Esta é a aplicação da frase perdoa as suas transgressões contra você.
Transgressões também se referem a ofensas contra Deus e contra o próximo. A mensagem clara aqui é: a aplicação do padrão do perdão a outros pela pessoa que ora será o padrão com o qual Deus a irá tratar. Esta verdade é consistente com a instrução do apóstolo Paulo em Romanos 1:18-28 de que a “ira de Deus” é revelada contra toda a injustiça praticada pelos homens. Deus expressa Sua ira entregando as pessoas a seus próprios desejos. Deus dá aos pecadores o que desejam, algo que irá levá-los à auto-destruição. Todo pecado é auto-destrutivo. O rancor contra o próximo está entre os pecados auto-destrutivos (Hebreus 12:14, 15). A aplicação aqui parece ser a de que, caso insistamos em guardar rancor contra nosso próximo, Deus nos vai entregar à nossa própria ira. Ela irá corroer as nossas vidas e destruir nossa relação com Deus e com os que estão à nossa volta.
Após inserir este ponto central no meio da oração, Jesus começa a revelar a parte final do quiasmo. Ele havia ensinado os discípulos a pedir pelo suprimento de suas necessidades físicas (o pão nosso de cada dia nos dá hoje) antes de aplicarem o princípio da misericórdia. Assim, agora, Ele instrui a Seus seguidores a pedir a Deus para cuidar de suas necessidades espirituais: E não nos deixes cair em tentação, mas livra-nos do mal. Este é o pedido para que Deus proteja o nosso coração das tentações deste mundo. Jesus nos ensina a pedir proteção, para que possamos manter nossos olhos fixos na vontade de Deus e no que precisamos fazer, sem nos distrair pelos desejos e prazeres, riquezas e ambições deste mundo. Esta oração de dependência espiritual é a frase C’ no quiasmo, combinada com a declaração C que reconhece nossa dependência física de Deus na provisão do pão de cada dia
A frase de Jesus, “livra-nos do mal”, é um pedido ao Pai por provisão para os momentos de tentação. A palavra grega que Mateus usa para “mal” é “poneros” (G4190). Ela se refere à influência negativa e destruição espiritual produzida pela imoralidade, ou os efeitos perversos, incluindo físicos, do mal. É provável que Jesus tenha em mente, primariamente, o mal espiritual neste caso, mas pelo fato de vivermos em um mundo físico, com interações espirituais (os humanos são tanto físicos quanto espirituais), Jesus deve ter usado “poneros” (mal) em ambos os sentidos. Deus sempre tem o poder de nos libertar do mal. 1 Coríntios 10:13 nos promete que Deus não permitirá que sejamos tentados além do que iremos conseguir suportar. Não há mal capaz de ultrapassar o poder de Deus (Romanos 8:28). Porém, é importante lembrar que precisamos confiar em Sua libertação. A oração de Jesus é tanto uma lembrança desta verdade quanto uma expressão da nossa dependência de Deus para sermos libertos do mal.
Ecoando Sua declaração anterior (Venha o teu reino), a frase B no quiasmo, Jesus ora “Teu é o reino” na declaração B’. Mais uma vez, Ele aponta a qual reino os discípulos pertencem, um reino verdadeiro, porém ainda não visível neste mundo. Por fim, Jesus conclui Sua oração como havia começado: santificando o nome de Deus e atribuindo a Ele poder e glória para sempre. A frase A’ completa o quiasmo, ecoando a declaração A, “Pai nosso que estás no céu, santificado seja o teu nome”.
Jesus, assim, termina sua oração com a palavra Amém. Esta palavra é uma transliteração da mesma palavra grega e hebraica. A palavra aparece também em latim, significando “que assim seja”. Ela pode aparecer no início ou no final de uma declaração. Na cultura ocidental, ela é mais observada ao final da oração, afirmação ou declaração.
Jesus sinaliza aos ouvintes que Ele havia concluído o modelo de oração. Então, Ele explica sobre o porquê do princípio da misericórdia ser o ponto mais alto do quiasmo, ao dizer: “Pois, se perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celestial vos perdoará; mas, se não perdoardes aos homens, tão pouco vosso Pai perdoará as vossas ofensas.”