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Significado de 2 Coríntios 1:1-7

Paulo escreve sua segunda carta à igreja em Corinto. Ele saúda os crentes com bênçãos de graça e paz. Ele compartilha alguns de seus sofrimentos por causa do Evangelho, mas declara que todos temos um Deus de misericórdia que nos consolará em nossos sofrimentos. Seremos libertos desses sofrimentos por um Deus que ressuscita os mortos.

Paulo começa sua carta apresentando-se a si mesmo e a um segundo autor: “Paulo, apóstolo de Cristo Jesus por vontade de Deus, e Timóteo, nosso irmão” (v. 1). A igreja em Corinto foi plantada por Paulo (ver Atos 18). Ele passou 18 meses plantando e estabelecendo a igreja lá. Como Atos 18 e xplica, ele começou na casa de Tício Justo, cuja casa ficava ao lado da sinagoga judaica. Não há registro de quantas igrejas domésticas foram estabelecidas ou quantos seguidores de Cristo havia quando Paulo deixou Corinto, mas Atos 18:8 nos dá uma idéia:

Crispo, chefe da sinagoga, creu no Senhor, com toda a sua casa; e muitos coríntios, ouvindo, criam e eram batizados (Atos 18:8).

Corinto estava localizada na Acaia (Grécia), situada no istmo de Corinto (ver mapa). Era servida por dois portos marítimos próximos, Cencréia a leste e Lacônia a oeste. A cidade estava localizada em uma importante rota comercial entre os mares Egeu e Jônico. Era uma cidade antiga, datada talvez de 800 a.C. Os romanos haviam destruído a cidade em 146 a.C. No entanto, Júlio César restabeleceu Corinto como colônia romana em 44 a.C. Quando Paulo chegou, provavelmente por volta de 50 d.C., Corinto talvez fosse considerada uma das cidades mais importantes do Império Romano, juntamente com Roma, Alexandria e Antioquia.

Conforme descobriremos mais adiante na carta, Paulo declara-se apóstolo de Cristo Jesus. Esta era uma descrição intencional e controversa. Após Paulo deixar Corinto e ver o crescimento e desenvolvimento da igreja lá, ele ficou ciente de algumas "dores do crescimento". Podemos ver algumas dessas "dores" abordadas na primeira carta escrevta por ele aos irmãos.

Provavelmente depois de receber relatos sobre a aceitação de sua primeira carta, Paulo tomou conhecimento de outras influências externas que causavam confusão e preocupação na igreja. Algumas dessas influências eram dirigidas a Paulo pessoalmente; em particular, alguns questionavam se sua autoridade apostólica era genuína. Assim, a segunda carta aos coríntios é talvez a carta mais pessoal de Paulo escrita a uma igreja. Sua integridade pessoal (2 Coríntios 1:12-24) e sua autoridade como apóstolo (Capítulo 4) estavam sendo questionadas por estranhos.

Vemos em 1 Coríntios que Paulo defendeu seu apostolado, presumivelmente daqueles que questionavam sua autoridade. O ataque contra o qual ele parece ter-se defendido era a acusação de não ser um apóstolo "verdadeiro" porque ele financiava a seu próprio ministério (1 Coríntios 9:2-12).

A palavra “apóstolo” referia-se a alguém que era enviado como mensageiro e implicava que a pessoa que o enviava era uma autoridade reconhecida. Na igreja do primeiro século, o uso da palavra “apóstolo” em um contexto bíblico foi empregado principalmente aos doze apóstolos designados e escolhidos por Jesus. No entanto, a palavra grega "apostolos" também é traduzida como "enviado", como vemos em João 16:13. O contexto determina quando o termo "apóstolo" se refere àqueles designados por Jesus como Seus "enviados" (Lucas 6:13).

Paulo entendia que sua autoridade apostólica vinha diretamente de Jesus. O parceiro de Paulo no ministério, Lucas, registrou essa comissão em Atos 9:15-16, quando Jesus diz a Ananias sobre Saulo (Paulo):

Mas o Senhor disse-lhe: Vai, porque este é para mim um vaso escolhido para levar o meu nome perante os gentios e os reis, bem como perante os filhos de Israel; pois eu lhe mostrarei quanto lhe é necessário padecer pelo meu nome (Atos 9:15-16).

Paulo descreve a seu próprio apostolado na igreja de Corinto em sua primeira carta:

Pois eu sou o mínimo dos apóstolos, que não sou digno de ser chamado apóstolo, porque persegui a igreja de Deus (1 Coríntios 15:9).

Apresentando-se como Paulo, apóstolo de Cristo Jesus pela vontade de Deus (v. 1), Paulo refuta qualquer afirmação de ser uma espécie de apóstolo autoproclamado. Pelo contrário, na providência da vontade de Deus, Cristo Jesus havia sido Aquele que enviou Paulo como apóstolo aos "gentios, reis e filhos de Israel" (Atos 9:15).

Paulo acrescenta: “...e Timóteo, nosso irmão”. Timóteo é listado como coautor e co-remetente da cartaTimóteo era um irmão e colega de missão na pregação do Evangelho de Jesus; porém, ele não foi designado como apóstolo. Timóteo esteve com Paulo no estabelecimento da igreja em Corinto (Atos 18:5) e fez visitas recentes em nome de Paulo à igreja (1 Coríntios 4:17, 16:10). Paulo afirma a validade do ministério de Timóteo entre os coríntios, bem como sua própria autoridade apostólica.

Ele começa: “À igreja de Deus que está em Corinto” (v. 1). Esta frase também é cheia de significado. Provavelmente vemos uma grande variedade de nomes todos os dias ao passarmos pelas diferentes igrejas em nossa comunidade. Paulo usa essa frase em ambas as saudações à igreja de Corinto, mas não usa essa designação específica - igreja de Deus - em nenhuma de suas outras epístolas às igrejas. Podemos inferir com isso que Paulo procurava enfatizar que a reunião de crentes em Corinto era de pessoas chamadas por Deus.

A palavra grega para “igreja” é "ekklesia", que literalmente significa "os chamados". A palavra era empregada no grego secular a alguns tipos de grupos políticos "chamados" para se reunir (como para votar) ou mesmo em sociedades. Além disso, como veremos mais adiante nesta carta, a igreja em Corinto permitia que a cultura da época influenciasse seu pensamento. Parece que a intenção de Paulo aqui pode ter sido a de lembrar os coríntios de que eles haviam ecebido um chamado especial, um chamado de Deus.

Seja qual for o motivo de Paulo em chamar a atenção para a “igreja de Deus”, devemos nos lembrar de que a igreja foi instituída por Deus, construída por Deus, sustentada por Deus, abençoada por Deus e cheia da glória de Deus. A igreja é composta por todos os que crêem em Jesus, que nasceram de novo e receberam o dom gratuito da justificação aos olhos de Deus (João 3:3,, 1516). Paulo, aqui, se dirige aos que haviam crido em Jesus e que viviam na cidade de Corinto.

Paulo dirige a carta “à igreja de Deus que está em Corinto, com todos os santos que estão em toda a Acaia(v. 1).

A palavra “santos” pode nos surpreender, particularmente à luz da primeira carta de Paulo à igreja de Corinto, uma igreja atormentada por pecados e disfunções. A palavra "santos" pode ser aplicada a qualquer um que creia em Jesus. É o sangue de Jesus que nos torna santos aos olhos de Deus.

Os que crêem em Jesus são santificados porque são enxertados no Corpo de Cristo. Jesus é quem os torna santos aos olhos de Deus. Não é por causa de obra alguma. Tudo o que é necessário para nascermos na família de Deus é demonstrarmos fé suficiente e olhar para Jesus, esperando ser curados do veneno do pecado (João 3:15, 16). Cada crente é santo aos olhos de Deus. Paulo escreve esta carta para encorajar os crentes em Corinto a viverem sua nova identidade em suas vidas diárias e experimentar os grandes benefícios de viver no poder de Deus, em vez de andarem no pecado.

Ao acrescentar a frase “que estão por toda a Acaia”, Paulo estende a carta a todos os crentes em Cristo na região chamada Acaia (ver mapa). Ele não estava falando de uma elite espiritual ao se referir aos “santos” neste contexto. Em vez disso, ele via a igreja como todos os que faziam parte do Corpo de Cristo — isto é, todos os que haviam crido.

É interessante notar que a palavra “santos” no Novo Testamento está sempre no plural, exceto quando é usada na descrição de Jesus Cristo. A maioria de nós ficaria desconfortável se uma epístola fosse escrita à igreja de Deus em São Paulo, Curitiba ou Fortaleza endereçada a todos os santos que estão lá. Porém, novamente, o contexto do uso do termo “santos” aqui se refere a todos os que foram justificados aos olhos de Deus ao receberem o dom gratuito da justiça de Jesus pela fé (2 Coríntios 5:21).

Em nossa era atual, às vezes é popular referir-se à igreja como sendo um grupo de pecadores salvos pela graça. Isso é semelhante ao que Paulo diz sobre os crentes do primeiro século. Conforme o apóstolo escreve em Efésios 2:

Pois pela graça é que sois salvos, mediante a fé; e isso não vem de vós; é o dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie (Efésios 2:8, 9).

Um dos versículos-chave da segunda carta aos Coríntios diz:

Se alguém está em Cristo, é uma nova criação; passou o que era velho; eis que se fez novo (2 Coríntios 5:17).

O texto afirma que qualquer um que creia em Jesus está "em Cristo" e se torna uma nova criação Nele. Uma vez que todos os crentes estão "em Cristo", passamos das "coisas velhas" (pecados) para as "coisas novas" (santos) aos olhos de Deus. Ambas as cartas de Paulo à igreja em Corinto são apelos, encorajamentos e admoestações para viverem o chamado da igreja "em Cristo".

Paulo exorta os discípulos a viverem a realidade espiritual no mundo físico. Jesus lhes havia presenteado com uma nova vida. Paulo os exorta a vivê-la em sua experiência física. Viver e andar por fé era a maneira de experimentar a vida real (conexão com os desígnios de Deus) em vez da morte (separação dos desígnios de Deus). A vida (como experiência) deve ser vivida em harmonia com os desígnios de Deus de que os seres humanos amem e sirvam uns aos outros (Mateus 22:37-39). A morte (como experiência) significa viver de forma coerente com o mundo e de acordo com seus valores de exploração e abuso uns dos outros.

O apóstolo Pedro também nos dá uma imagem do que somos e devemos ser "em Cristo":

Mas vós sois a geração eleita, o sacerdócio real, a nação santa, o povo todo seu, para que proclameis as grandezas daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz (1 Pedro 2:9).

Um tema importante nas Escrituras é que fomos totalmente aceitos na família de Deus por Sua graça. Isso é uma dádiva incondicional; é um dom gratuito do amor de Deus (João 3:16). Deus nunca rejeitará a Seus filhos como membros de Sua família.

No entanto, embora nossa aceitação na família de Deus seja incondicional, para sermos aprovados por Deus isso irá requer que andemos em obediência. Assim como um pai humano não deve aprovar comportamentos autodestrutitvos de seus filhos, Deus não aprova ou recompensa o comportamento autodestrutivo de Seus filhos. Pecar significa caminhar longe dos mandamentos de Deus, levando-nos a uma experiência de morte, ou separação dos bons desígnios de Deus (Romanos 6:23).

Paulo continua sua saudação dos coríntios: “Graça a vós e paz, da parte de Deus, nosso Pai, e da do Senhor Jesus Cristo(v. 2). Podemos supor que isso fosse apenas uma saudação, não muito diferente de quando encontramos alguém hoje em dia e dizemos: "Como você está?" No entanto, aqui é possível que Paulo estivesse usando um jogo de palavras, já que a palavra grega para "olá" é "charein" e o apóstolo inicia a frase com a palavra grega “graça”, "charis".

O uso da palavra “graça” é repleto de significado. É pela graça de Deus, através de Cristo, que os santos podem continuar a experimentar o perdão e a purificação de seus pecados e a viver na esperança certa da ressurreição e da vida eterna (Efésios 2:8-9).

“Graça” significa favor. Podemos ver isso em versículos como:

Jesus crescia em sabedoria, em estatura e em graça diante de Deus e dos homens (Lucas 2:52).

Deus concede Seu favor a qualquer um que tenha fé em Jesus, perdoando-os de seus pecados (João 3:14, 15) - neste caso, Seu favor significa libertá-los do veneno mortal do pecado e gerá-los como filhos de Deus. Esta é a graça do novo nascimento.

Deus também concede favor aos que andam em obediência à Sua palavra. Este é o favor das recompensas eternas, o que Jesus chama de "tesouros no céu" (Mateus 19:21). O favor de Deus é sempre uma questão de Sua misericórdia, pois não há padrão algum acima Dele. Ninguém pode exigir nada de Deus, pois Ele não está amarrado a padrão humano algum.

Quando as Escrituras falam das recompensas de Deus pelo serviço fiel dos santos, tais recompensas são uma resposta da Sua graça, pois somente Deus decide o que Ele aprova. Esta carta de Paulo foi escrita a crentes e ele os adverte a cuidar de como vivem, pois todos seriam trazidos ao tribunal de Cristo (2 Coríntios 5:10).

Para muitas pessoas, mesmo os seguidores de Cristo, a paz é uma palavra ou pensamento bastante positivo. A paz é muitas vezes pensada como a ausência de hostilidades ou algum tipo de trégua em meio a circunstâncias preocupantes. No entanto, na saudação e bênção da paz de Paulo, há muito mais. A idéia judaica de "shalom" (paz) é um conceito amplo que significa que todas as coisas trabalham em harmonia com seu projeto. Os judeus usam "shalom" como saudação até hoje.

Essa idéia de paz, onde todas as coisas trabalham em harmonia com os bons desígnios de Deus, pode ser vista em várias aplicações dentro das Escrituras. Jesus diz:

A paz vos deixo, a minha paz vos dou; eu não vo-la dou como a dá o mundo (João 14:27).

A paz de Deus não é como a paz do mundo. A paz de Deus vem de Deus. Paulo retoma isso em Filipenses, ao escrever:

A paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará os vossos corações e os vossos pensamentos em Cristo Jesus (Filipenses 4:7).

A paz que Paulo usa aqui tem suas raízes nas saudações do Antigo Testamento e no significado de "shalom". É uma paz ligada não tanto às nossas circunstâncias, mas sim a um bem-estar transcendente. Na carta de Paulo à igreja de Colossos, ele escreve:

...e, por ele, reconciliar todas as coisas a si mesmo, tendo feito paz pelo sangue da sua cruz (Colossenses 1:20).

Não importa o que possa estar acontecendo no mundo e em nossas vidas, podemos experimentar bem-estar através da presença de Cristo em nós e através de quem somos em Cristo. Essa paz sempre traz consigo um senso de justiça, ou seja, uma harmonia com os bons desígnios de Deus para Sua criação. Embora Paulo estivesse saudando a igreja, ele era apenas um mensageiro que os direcionava à fonte da graça e da paz - “Deus, nosso Pai, e da do Senhor Jesus Cristo” (v. 2).

Após a revelação da fonte da graça e da paz, Paulo concede uma bênção aos coríntios. Ele acrescenta: “Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai de misericórdias e Deus de todo o conforto” (v. 3).

Não era incomum que as cartas (também conhecidas como epístolas) à época de Paulo registrassem uma declaração louvor ou bênção, incluída por Paulo neste versículo. Ele se dirige ao conteúdo principal da carta, mas deseja que seus leitores entendessem que sua mensagem, embora em muitos aspectos fosse pessoal, era fundamentada em Cristo. Deus é soberano em todas as coisas e nós O conhecemos por meio de Seu Filho, Jesus Cristo. Jesus não é apenas nosso Salvador, mas também nosso Senhor. Ser Senhor significa ser governante e soberano sobre tudo. Pelo fato de Jesus ter sido fiel e ter aprendido obediência, Ele recebeu toda a autoridade sobre o céu e a terra (Mateus 28:18).

Deus não apenas é o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, Ele também é o Pai de misericórdias. Toda graça, misericórdia e compaixão vêm do Pai e, quando Paulo começa a introduzir suas palavras de conforto nas "aflições", ele deseja que seus leitores soubessem quem era a fonte de todo conforto, o Pai. O verdadeiro conforto não vem das circunstâncias. O verdadeiro conforto não vinha do apóstolo Paulo. Deus era e é o Deus de todo conforto.

Aqui e nos versículos seguintes, o uso da palavra “conforto” usada por Paulo vem da palavra grega "paracletos". Jesus usou esta palavra ao prometer enviar o Espírito Santo:

...convém-vos que eu vá. Pois, se eu não for, não virá a vós o Paráclito; mas, se eu for, enviar-vo-lo-ei (João 16:7).

O verdadeiro conforto não é encontrado nas circunstâncias ou em outras pessoas. O verdadeiro conforto vem da pessoa de Deus. Jesus enviou Seu Espírito para habitar em nós e ser nosso Consolador.

Em Mateus 5:4, Jesus diz: "Bem-aventurados os que choram, porque eles serão consolados". Isso deixa claro que Deus é a fonte do verdadeiro conforto, não as circunstâncias.

Essa afirmação e a frase de Jesus mencionada no Evangelho de João referindo-se ao Espírito Santo como "Consolador", nos dá o contexto do uso da palavra “conforto” por Paulo nos próximos versículos do capítulo 1.

Deus de todo o conforto, que nos conforta em toda a nossa tribulação (v. 3b-4a).

Como vemos em João 16:7, o Espírito Santo ("paracletos") é dado por Deus como nosso Advogado, Intercessor e Consolador. Um dos significados alternativos de conforto no dicionário é "bem-estar, contentamento, vida de facilidade". Isso reflete o conceito de felicidade ou conforto de nossa cultura baseado na prosperidade material ou nas facilidades circunstanciais. Paulo fala aqui de algo totalmente diferente; ele fala sobre uma condição espiritual que transcende completamente as circunstâncias.

Quando Jesus e Paulo usam a palavra "consolo", é importante entender o contexto no qual a palavra é usada para podermos aplicar o entendimento de que Paulo e Jesus têm sobre a condição espiritual que transcende as circunstâncias físicas. Paulo deixa claro que aqueles que seguem a Cristo em plena obediência, buscando Sua recompensa, encontrarão "aflições" e "sofrimentos" - coisas opostas ao conforto. Este é outro dos muitos grandes paradoxos das Escrituras; o caminho do verdadeiro conforto (espiritual) é através do sofrimento (físico).

Este provavelmente não tenha sido um lembrete tão popular para a igreja em Corinto, nem é algo facilmente aceitável a qualquer igreja. Nenhum de nós decide acolher o desconforto físico. Ao dizer que o Pai é o Deus de toda consolação, que nos conforta em toda a nossa aflição, Paulo apresenta a realidade de que a aflição pode ser, em grande parte, uma dificuldade diretamente decorrente do nosso testemunho fiel e obediência a Cristo, andando em Seus caminhos.

Essa idéia é difícil de engolir para muitos. É uma tendência humana buscar a ajuda de Deus para aliviar nossos desconfortos físicos. Não há problema algum nisso, pois há muitos casos nas Escrituras em que Deus forneceu tal conforto. No entanto, Paulo fala aqui sobre algo que transcende as circunstâncias físicas: o conforto que ocorre em todas as nossas aflições, em vez de conforto de sermos libertos delas.

O conforto de Deus não é algo que vai e vem. É algo que está sempre presente. Uma vez que o conforto de Deus está sempre presente, independentemente das circunstâncias, não somos apenas confortados espiritualmente, mas também podemos confortar uns os outros:

...para podermos confortar aqueles que se acham em qualquer tribulação, pelo conforto com que nós mesmos somos confortados por Deus (v. 4b).

Paulo abre seu coração aos coríntios de uma maneira pessoal, para que eles pudessem ver o quadro geral. Nesta carta, ele logo defenderá seu próprio apostolado contra os detratores que procuravam deslocar sua influência. Como Paulo estava defendendo sua autoridade apostólica, seria de se esperar que ele se apresentasse de forma mais positiva.

Como ele admite que compartilhava de "aflições" e "sofrimentos", não seriam esses sinais de fraqueza?

Seria natural pensar que se Paulo tivesse a grande autoridade apostólica que reivindicava ter, ele não deveria sofrer ou ser afligido. As pessoas deveriam esperar que Deus libertasse dos obstáculos para o avanço do Evangelho a qualquer homem de grande fé.

Paulo, no entanto, ratifica as afirmações a respeito de seus próprios sofrimentos, declarando: “Pois, assim como para conosco crescem os sofrimentos de Cristo, assim também por Cristo cresce o nosso conforto” (v. 5).

Isso traz à mente a carta de Paulo aos Filipenses, quando ele diz: "...para o conhecer e o poder da sua ressurreição e a participação dos seus sofrimentos, conformando-me com ele na sua morte" (Filipenses 3:10).

É essa comunhão com Cristo e a identificação com Seus sofrimentos que Paulo descreve em 2 Coríntios. Paulo entende e ensina a seus seguidores que era suportando os sofrimentos de Cristo que eles participariam da recompensa de Sua herança (Romanos 8:17b; Apocalipse 3:21).

Muitos de nós, como seguidores de Cristo, certamente ficaríamos entusiasmados em experimentar o "poder de Sua ressurreição". Porém, esse poder é demonstrado através da "comunhão de seus sofrimentos" (Filipenses 3:10). Paulo acabara de dizer no versículo 5: “...assim como para conosco crescem os sofrimentos de Cristo”. Veremos alguns sofrimentos físicos severos descritos vividamente no capítulo 11. Porém, essa "comunhão" com os sofrimentos de Cristo é mais do que apenas física.

Grande parte dos sofrimentos de Cristo pode ser identificado pela rejeição das pessoas a quem Ele havia vindo para servir (João 1:11; Hebreus 12:2). Andar em Cristo significa separar-se, ou ser santificado, do mundo e de seus caminhos (1 João 2:15-17). O mundo é um senhor exigente, demandando nossa plena obediência. Ele rejeita os que não seguem a seus caminhos (Mateus 6:24; João 7:7; 15:18; 17:25).

Parte da abundância que Paulo menciona em referência aos sofrimentos de Cristo será exposta nesta carta, incluindo a perseguição física (2 Coríntios 11:22-23). Os sofrimentos também incluem "conflitos" e "medos" (2 Coríntios 7:5). Ao seguirmos a Cristo, somos conduzidos no caminho para longe do mundo e, assim, os "sofrimentos" e as "aflições" não serão interrompidos nesta vida. É inevitável que nosso corpo exterior seja corrompido (2 Coríntios 4:16; 5:1-2).

É por isso que Paulo continua a dizer: “assim também por Cristo cresce o nosso conforto”. Paulo falará de uma série de coisas que lhe davam conforto. De suma importância em seu conforto estava seu conhecimento, pela fé, de que seus sofrimentos por Cristo produziriam a maior das recompensas. Ele diz:

Pois a nossa leve aflição momentânea para nós produz cada vez mais abundantemente um eterno peso de glória (2 Coríntios 4:17).

Veremos que o "eterno peso de glória" pelo qual Paulo esperava tem múltiplas aplicações, todas elas enraizados na fé profunda de que Deus recompensaria grandemente sua caminhada obediente de fé nesta vida, muito além de toda compreensão humana (1 Coríntios 2:9).

Nos conforta saber que o que sofremos aqui tem um propósito - tudo resultará em algo bom. Parte do bem advindo dos sofrimentos ocorre nesta vida. Eles nos dão a oportunidade de investir em outros:

Mas, se somos atribulados, é para o vosso conforto e salvação; se somos confortados, é para o vosso conforto (v. 6).

Se os crentes em Corinto procuravam conforto, de forma a conseguirem fazer com suas "aflições" e "sofrimentos" desaparecessem, eles não o veriamisso como algo usado por Deus em sua missão de salvação.

Sempre que encontrarmos a palavra “salvação”, é importante perguntar: O que está sendo salvo de quê ou de quem?

Podemos ver isso em versículos como Marcos 5:34, onde a palavra grega "sozo" (muitas vezes traduzida como "salvar") é traduzida como "bem", referindo-se à mulher que havia sido libertada de uma doença:

Jesus disse-lhe: Filha, a tua fé te curou; vai-te em paz e fica livre do teu mal (Marcos 5:34).

Paulo está escrevendo aos crentes em Corinto e os chama de "santos" porque todos eles haviam crido em Jesus (2 Coríntios 1:1). Eles haviam chegado à fé salvadora, sendo justificados aos olhos de Deus, através do ministério direto de Paulo (1 Coríntios 9:2). Portanto, eles não mais tinham necessidade de serem salvos da separação da família de Deus, pois haviam nascido de novo.

Neste contexto, eles precisavam ser salvos do desânimo de viver em dificuldades que podiam desviá-los. O mundo tenta nos vencer para que nos desesperemos e paremos de andar pela fé. O mundo deseja que cheguemos à seguinte conclusão: "Não vale a pena". Paulo afirma nesta carta que caminhar como testemunha fiel de Cristo, suportando a rejeição do mundo, vale muito a pena. De fato, isso nos leva a um “eterno peso de glória" (2 Coríntios 4:17).

É difícil para o atleta suportar a labuta dos treinos; é a esperança da "glória" da vitória na competição que o estimula. Da mesma forma, Paulo nos traz o grande conforto de que existe uma vitória melhor e eterna, maior do que qualquer troféu, que espera a todos os que andarem em obediência aos mandamentos de Jesus.

Através de sua aflição, Paulo busca conduzir seus discípulos ao consolo e à salvação. Neste caso, o conforto de seus discípulos seria vê-lo prosperando espiritualmente, embora estivesse sofrendo. A salvação que os crentes de Corinto poderiam experimentar ao observarem as aflições de Paulo os libertaria do medo de sofrer também.

Os sofrimentos podem levar os crentes a duvidar de Deus e questionar Sua provisão. Paulo pretendia que seu testemunho de estar fortalecido nos sofrimentos e sua determinação de ser recompensado na aflição encorajasse e edificasse os coríntios. Através de seu exemplo, eles poderiam aprender e evitar a tentação de duvidar em suas próprias experiências com Cristo. O maligno plantaria o seguinte pensamento em suas mentes: "Se eu realmente estivesse seguindo a Cristo, essas coisas não aconteceriam comigo". Sabemos disso porque o livro de Jó nos diz que este é um dos principais enganos de Satanás.

Aqui, no entanto, Paulo compartilha sua experiência com eles ao dizer: “como sois participantes dos sofrimentos, assim também o sereis do conforto”. Posso consolá-los, diz ele, porque sei que "aflições" e "sofrimentos" fazem parte do plano e propósito de Deus. Deus usa as dificuldades para nos conformar à Sua imagem (Romanos 8:28-29). Ao sofrermos a rejeição do mundo e mantermos nossa obediência fiel, estaremos buscando as recompensas de Cristo (Filipenses 2:5-10; Apocalipse 3:21).

Paulo, agora, apresenta uma definição sobre seu conforto:se somos confortados, é para o vosso conforto, o qual opera no suportar com fortaleza os mesmos sofrimentos que nós também sofremos(v. 6). O verdadeiro conforto no sofrimento se dá ao percebermos que eles são um meio para um fim. Eles nos levam a um "eterno peso de glória" (2 Coríntios 4:17). Portanto, podemos abraçar os sofrimentos com uma grande medida de paciência. É como um atleta que sente o desconforto de treinar para uma prova.

A tolerância não é algo ao qual experimentamos com frequência no século 21. Vivemos em um mundo de grande conveniência. Acionamos um interruptor e a luz se acende; não precisamos encher a lâmpada de azeite, aparar o pavio, acender e cuidar da chama para obter luz. Ficamos irritados se a conexão com a internet leva dez segundos para se conectar. Estamos acostumados com o acesso instantâneo.

É natural transpor essa experiência para Deus. Esperamos que Ele seja nosso "gênio da garrafa" ou uma "máquina de venda automática cósmica" à qual usamos para obter nossos desejos. Assim, quando pensamos em "conforto", tendemos a pensar em fazer com que as "aflições" ou os "sofrimentos" desapareçam.

Paulo, aqui, ensina o contrário disso. Ele diz que havia passado pelos mesmos sofrimentos e que através da paciência eles poderiam experimentar o conforto de Deus. Temos a oportunidade de ser como Paulo, sendo guiados pelos sofrimentos. Assim, veremos, pela fé, os propósitos de Deus serem cumpridos. Pode ser que vejamos o propósito de Deus cumprido, pelo menos em parte, nesta vida. Mais frequentemente, entretanto, os sofrimentos verão seu propósito cumprido na próxima vida - "eterno peso de glória" (2 Coríntios 4:17).

Assim, sabendo que o sofrimento era um testemunho que permitiria a seus discípulos em Corinto seguirem seu exemplo, Paulo podia dizer: “A nossa esperança por vós é firme” (v. 7). A esperança à qual Paulo se refere é a esperança de que os coríntios se tornassem partícipes dos sofrimentos e do conforto. Paulo diz que essa esperança é firmemente fundamentada, podendo ser tanto um resultado da fé inabalável do apóstolo na promessa e provisão de Deus, quanto em sua fé na resposta dos coríntios.

Paulo expressa sua esperança para os irmãos Corinto: “sabendo que, como sois participantes dos sofrimentos, assim também o sereis do conforto(v. 7). Paulo desejava que seus discípulos entendessem que as dificuldades que enfrentavam os estava tornando participantes de seus sofrimentos. O pronome “nosso” aqui presumivelmente incluía os sofrimentos de Paulo e Timóteo (2 Coríntios 1:1).

Embora fosse improvável que os coríntios estivessem experimentando o grau de dificuldade experimentado por Paulo (ver 2 Coríntios 11:24-29), o apóstolo aparentemente considerava que todo sofrimento por Jesus se enquadrava na mesma categoria. Paulo não diz "o meu sofrimento é maior que o de vocês, por isso sou mais santo". Pelo contrário, ele considera que qualquer sofrimento pelo nome de Cristo significava ser partícipe dos seus sofrimentos. Portanto, se eles compartilhassem seus sofrimentos, eles também seriam participantes do  seu conforto.

A experiência do apóstolo em ser consolado por Deus em meio a seus sofrimentos e ver o poder da ressurreição de Jesus mencionado por ele em 2 Coríntios 1:9 tornam-se o firme fundamento de sua esperança. E é nessa esperança confiante que Paulo e seus discípulos em Corinto podiam acessar o conforto. O conforto vem através da fé no resultado certo das promessas de Deus.

Paulo encoraja os crentes em Corinto a olhar e ver que as "aflições" e "sofrimentos" seriam sempre acompanhadas pelo conforto de Deus. Esse conforto vinha da esperança no poder de Deus e Suas promessas (2 Coríntios 4:17).

Parte do conforto ao qual Paulo se refere aqui provavelmente viria através de Paulo e Timóteo aos irmãos. Todo o consolo, em última análise, vinha do próprio Consolador, o Espírito Santo. Paulo convida a igreja a ser partícipe de nossos sofrimentos, bem como partícipe de nosso conforto. Eles deveriam participar tanto dos sofrimentos de Paulo quanto de seu conforto, de forma a levá-los à perseverança nos sofrimentos. Este é o caminho para alcançarmos a incrível recompensa do "eterno peso de glória" (2 Coríntios 4:17).

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